quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

A FLORISTA


 “Boa tarde, senhora”.

 “...tarde, doutor. O que vai hoje?”

 “Hoje, rosas vermelhas. As mais lindas que a senhora tiver”.

 Era o ritual de todas as sextas-feiras, em final de tarde. Já haviam sido muitas delas. Com bom tempo; ou sem bom tempo; com sol radioso ou com chuva persistente. Sempre o mesmo local, a mesma pessoa, a mesma florista, a mesma hora. As flores é que poderiam variar conforme as que houvessem sido escolhidas na semana anterior. Não havia repetição em duas semanas seguidas.

 A variedade das cores e tons e o viço dos vegetais daquele pequeno recanto próximo a uma avenida movimentada, transformavam o asfalto em um belo jardim que atraia olhares dos passantes de final do dia. A semana estava terminava. Há os apressados que não se detém e os apressados que esquecem, por momentos, seu estresse para admirar o que enche os olhos de beleza e um pouco de paz que só o que é natural consegue.

 Ele mantinha o olhar fixo no que ela fazia. Nos menores detalhes: nos costumeiros e nos novos, se houvessem. As vezes, punha as mãos nos bolsos como se sentisse inseguro.

 Nesta sexta, volta a repetir-se o mesmo que em todas elas:

 “Boa tarde, senhora”.

 “...tarde, doutor. O que vai, hoje?”

 “Deixo para a senhora escolher. Hoje são do seu gosto”.

 Pagou, guardando a carteira no bolso do casaco e falou:

 Quando ela vai alcançar-lhe as flores, ele fala: “Esta é para entregar”

 “E o endereço qual é”, perguntou a florista.


 Ele responde: “Na verdade não sei. São para você”. E afastou-se sem dizer mais nada, pensado como seria na sexta-feira seguinte.

Um comentário:

  1. Inteiramente à mercê da cúmplice,ele já se habituara a mandar seu recado.

    Nem se preocupava com a escolha

    – crisântemos, otimismo
    – rosas vermelhas, amor e desejo
    – violetas, eu-te-farei-amar...

    Discreta, a florista parecia premeditar algum desfecho para aquele caso.

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