quarta-feira, 11 de março de 2015

AS "JUSTIÇAS" BRASILEIRAS

 Que o Brasil é um país politicamente singular nenhum brasileiro tem dúvida. O que pode variar é a maneira como cada um argumenta para concordar com a afirmativa. Há justificativas para todos os gostos, desde a extrema esquerda até a extrema direita. Neste último caso estamos procurando quem assuma essa condição, embora se saiba que seus adeptos são numerosos. Ninguém quer ser direitista, no Brasil.

 Quis iniciar com a afirmativa acima para justificar que também reconheço a existência de peculiaridades “inexplicáveis” em todos os campos do relacionamento da comunidade com as lideranças responsáveis pela condução do País e, mais importante ainda, daqueles organismos que têm o compromisso de servir de elo de ligação confiável entre governo e sociedade, mais comumente designada como “mídia” (aportuguesando), seja ela falada, escrita ou televisionada e todas demais que tenham a faculdade de lidar, diretamente ou indiretamente, com as questões de opinião pública.

 Grosso modo poderia dizer-se que temos “três justiças” no Brasil, todas elas com suas causas e conseqüências inerentes à responsabilidade com que cada uma é aplicada ou faz produzir seus efeitos. A primeira, lógico, é a “justiça oficial” que, definida pela nossa Constituição é exercida através de seus inúmeros organismos estatais, obedecendo às regras estabelecidas em lei. De um  modo geral funciona razoavelmente bem não fora reconhecidamente lerda. Como toda iniciativa humana, comete suas falhas. Sobre ela, assim se referiu nosso mais ilustre sábio, Ruy Barbosa: “Justiça que tarda não é justiça”. Isso, talvez, tivesse servido para a época em que foi feita a declaração. É uma discussão para outro espaço.

 A segunda justiça é a da sociedade. Levados, às vezes, pelos mais estranhos motivos, os cidadãos, geralmente reunidos em um grupo ocasional, tomam a deliberação de decretar que determinada pessoa é culpada de um crime baseados apenas em pequenos indícios mesmo sem qualquer comprovação concreta. É o tipo de justiça que nos transforma em seres incapacitados de pensar racionalmente e pode ocasionar, inclusive, a prática da pena capital – até de forma bárbara -, como ocorreu recentemente (No Estado do Paraná, se não me falha a memória) e ocasionou a morte de uma pessoa por espancamento sob suspeita de um crime que, depois, foi concluído que não havia de fato cometido.

 A terceira justiça é a praticada pela mídia. Embora não venha implicar uma pena capital em sua ação, é a mais devastadora delas pelo número de pessoas que pode atingir com uma simples citação. Tão logo um crime é trazido ao conhecimento da opinião pública pelos responsáveis pela investigação, mesmo que ainda não exista qualquer decisão judicial os nossos comunicadores já escolhem a “quem” culpar. A partir daí já podem começar a atribuir uma infinidade de irregularidades que passam a manchetear em caixa alta em jornais ou até em especiais de TV. Se o denunciado é uma personalidade no meio político as suas mazelas passam a dominar o noticiário e os principais âncoras fazem citações quotidianas sob qualquer pretexto, reforçando sua “condenação”. Alguém poderia perguntar: “Mas, e se o denunciado for absolvido em todas as instâncias?”. A resposta vem da forma mais sem compromisso possível: “Bem, ele não é culpado, mas poderia ser, não é?  Desculpem a nossa falha...”

 Só para não deixar a afirmativa sem ao menos algum exemplo, basta rememorarmos casos que tiveram grande repercussão entre os muitos que já ocorreram nos mais diversos meios de comunicação. Quem não lembra dos episódios “Ministro Alceni Guerra”, e dos professores da “Escola de Base de Brasília”?. Todos “condenados” pela mídia e, depois, inocentados pela justiça oficial. E há, também, um que atingiu diretamente os gaúchos. Quem não sabe que um de nossos deputados federais foi lançado à execração pública e acabou perdendo seu mandato? Uma revista semanal de circulação nacional “confundiu” cem dólares com cem mil dólares e não quis voltar atrás porque as suas  revista já haviam sido impressas? Recentemente, a mesma revista teve um de seus diretores envolvido com o doleiro do caso Senador Demóstenes/Carlos Cachoeira, só que a única menção que ela fez sobre o fato foi a de que os duzentos contatos telefônicos feitos, pelo jornalista, com o doleiro eram por motivos “profissionais”.

 Na verdade, o objetivo principal deste artigo é lançar um alerta para o que está ocorrendo em relação à divulgação de diversos problemas que o País vem enfrentando, sejam eles econômicos ou políticos. A grande mídia oligopólica, a serviço da direita e da elite brasileira, está cerrando fileiras na busca de um impedimento da Presidenta e, para tanto, qualquer meio é válido para atingir seu objetivo. É necessário que cada brasileiro, antes de tomar qualquer posição, faça uma análise profunda da situação não se deixando levar pela massificação da idéia de que tudo no Brasil se tornou um caos. Não sou defensor incondicional de tudo o que o Governo vem fazendo. Acredito que há muitas falhas, mas não vou incorrer na leviandade de querer contribuir para a instalação de um quadro reacionário, a serviço de interesses que não são os  da população menos favorecida, mas, apenas, concorrerá para a manutenção de benesses seculares que uma parcela reduzida de privilegiados continua a desfrutar.


(Publicado no Jornal Fronteira Meridional em 11/03/15)

sexta-feira, 6 de março de 2015

(SETENTA...UFA!)


 (Hoje, quero pedir licença aos meus leitores, mesmo que poucos, para ter meus minutos de pieguice e sentimentalismo, ocupando o menor espaço de tempo  e papel).

 Dizer que o tempo passou depressa é uma expressão que já foi cantada em prosa e verso vezes sem conta e, portanto, quase  não quer dizer nada de significativo. Sempre achei que o tempo foi uma invenção de Deus para chatear os mortais já que ele, por ser eterno, não precisa preocupar-se  com esse problema. Sobrou para nós, então, administrar essa questão com todas as implicações que contém. Já tive preocupações com o inevitável, mas hoje consigo lidar melhor com essa incógnita do “depois”. Se ele existir, espero que tenha a minha disposição muitos livros (digitais ou de papel?) – de todos os conteúdos – porque a eternidade sem leitura deve ser um saco. De uma coisa tenho certeza: ainda há  muita coisa boa com que poderia me deleitar. Ainda nem consegui ler todos os clássicos que gostaria.

 O que deve/pode fazer alguém que chegou a esta idade? Talvez já não sejam muitas as opções. Vamos lá. Acho que uma delas e perguntar-se sobre o que fez com as chances e os privilégios que desfrutou. No meu caso, não quero lembrar nem para mim mesmo, agora que já entardece a vida, os momentos que deveriam ser, mas que deixei passar; os que posterguei (e acabei perdendo) e os que aproveitei e que frutificaram e trouxeram-me satisfação.

  Mas relembrar também é parte obrigatória do cenário do tempo. Para isso serve aquele escaninho importante do cérebro humano que tem a capacidade de recriar, trazendo o passado de volta sem compromisso com a exatidão dos fatos. É bom sentir, de novo, o sabor das primeiras vezes, mesmo que tenham um pouco de gosto de sal. Os primeiros sonhos; as primeiras surpresas; as primeiras decepções e as primeiras fantasias vão e voltam no redemoinho das emoções passageiras que nem sempre se consegue evitar. Nesse rol é inevitável incluir as cenas da infância no Cerro, com as pescarias em família ou o jogo de bola de gude no caminho da enfermaria; andando no trolei da pedreira (escondido do ronda, lógico), tomando banho nas “canteras” ou as peladas no campo da hidráulica, disputando rapadura. Mais tarde, o início do desconhecido: a primeira aula no Joaquim Caetano com a professora Nida, e a primeira colega que fazia a diferença. As matinês no Esperança, trocando gibis também foram uma marca importante no relacionamento com novos amigos e outras descobertas que depois passaram a fazer parte da minha cultura de guri, adolescente e adulto. O primeiro emprego no Laboratório do Prof. Martins e os outros que vieram depois, desde ser “guarda-livros” no Alvim Borges até o escritório do Roberto Ferreira. Daqui, para Porto Alegre quando se inicia uma nova fase. Completa mudança na vida e coragem para enfrentar a cidade grande com seus problemas e mistérios. Deste período, posso dizer que sempre – como até hoje - carreguei Jaguarão comigo. Guardei sempre com muito carinho todas as boas lembranças da minha “cidadezinha” que foram ficando cada vez mais distantes a medida em que o tempo passava. Certamente os encontros da Colônia Jaguarense contribuiram bastante para manter aquecido esse clima interiorano bem próprio de nossos conterrâneos.

 Penso que nada melhor para encerrar do que uma volta bem ao início, quando tudo começou, para rememorar o som da voz materna da mãe castelhana cantando “a-rô-rô mi niño; a-rô-rô mi sol; a-rô-rô pedazo de mi corazon...”

 

 (Acredito que isto é o máximo que este coração setentão e os leitores conseguem agüentar!).